A insensata exibição de troféus humanos
Um debate urgente e necessário nas novas mídias informativas
de Bom Jesus do Itabapoana está no sensacionalismo exacerbado contido no
noticiário policial em nossa região, os blogs e sites do norte e noroeste
fluminense estão trabalhando na ilegalidade e ainda não perceberam tal prática. E é sobre duas ilegalidades que estou abordando neste texto para que todos
reflitam, tanto os administradores desses veículos como a maioria dos
internautas que apreciam este tipo de noticiário, que andam muito intolerantes
diga-se de passagem.
O que inspira a publicar este artigo foi uma reportagem de uma
suposta tentativa de homicídio que foi publicada inicialmente no site “Gazeta do Noroeste” e replicada no blog do Jailton da Penha, e nela temos três pontos questionáveis que se repetem em praticamente
todas as publicações deste gênero.
O primeiro questionamento é a tipificação criminal noticiada,
sendo certo que cabe somente à Polícia Civil apurar e constatar qual crime foi
de fato cometido, inclusive tenho recebido informações que frequentemente temos
desentendimentos entre policiais militares e civis na interpretação dos
flagrantes lavrados no momento das ocorrências, à PMERJ cabe tão somente relatar
para a Polícia Judiciária os fatos ocorridos, e não tipificar o fato.
Inclusive eu mesmo já testemunhei situação como esta em que a PM interpretava que determinada situação se configurava como cárcere privado e a PC não via nada além do que um caso de lesão corporal.
Inclusive eu mesmo já testemunhei situação como esta em que a PM interpretava que determinada situação se configurava como cárcere privado e a PC não via nada além do que um caso de lesão corporal.
O segundo questionamento é uma grave violação constitucional
que vem ocorrendo sistematicamente nessas publicações, a exibição de
fotografias dos detidos e flagrados se tornou em uma verdadeira exposição de
troféus humanos que são submetidos ao julgamento midiático e sempre são
condenados pela opinião pública, sendo que mesmo se fossem condenados, os
mesmos seriam para serem submetidos a um processo de recuperação e
ressocialização de acordo com o objetivo do sistema penal existente no país.
Não obstante, a exibição constante dessas fotografias, mesmo
com um trabalho para desfigurar o rosto do fotografado, faz com que as pessoas que o
conhecem sem dúvidas que o identificam de imediato, e o mais grave é que tal
prática é proibida por lei, tanto que a maioria dessas fotografias são
registradas fora do recinto policial e fora da tutela do estado, como no caso
desta matéria, temos a foto do detido dentro de um veículo que supostamente
seria a viatura que o conduziu na ocorrência.
Diferente das outras matérias policiais com este tipo de
violação, nesta tivemos uma acadêmica de direito que fez uma abordagem no campo dos
comentários do compartilhamento cobrando do administrador da página sobre a
improcedência da tipificação da ocorrência, sendo certo que ela por ser amiga
da mãe do detido a mesma está acompanhando o caso, como fez no dia indo até delegacia para acompanhar o processo lavrado.
Ela alega que não se trata de tentativa de homicídio e sim
uma tentativa de lesão corporal oriunda de uma briga de família ou por questões
passionais, e a mesma foi contundente ao questionar a fotografia que ilustra a
matéria polemizada, concluindo ela que já havia extraído a mesma para constar
nos autos do processo para elaboração da defesa, alegando ainda que seria
completamente descabido um detido pela polícia ser obrigado a segurar um papel
com as inscrições da guarnição que o prendeu posando para fotografia/troféu.
Neste caso o estado em vez de iniciar um trabalho de
recuperação social deste indivíduo, o mesmo estado está alimentando o ódio do
mesmo que dificilmente se recupera com um tratamento desses, lembrem-se que em
nosso sistema penal não existe pena de morte ou prisão perpétua, contudo devemos
sempre analisar ocorrências policiais como o início de um processo de
recuperação do detido para retornar à sociedade.
Este caso sem dúvidas terá desdobramentos diferentes de
outros casos de ocorrências policiais no que tange a fonte da informação desta e de outras reportagens, haja visto que em praticamente todas essas publicações a fonte apesar
de ser citada como da PMERJ, não é a assessoria de comunicação do 29º BPMERJ
que fornece o conteúdo da notícia com as fotografias, geralmente são os
policiais que participam da operação em que eles mesmos fotografam os detidos e
enviam por e-mail ou por mídias sociais o conteúdo da ocorrência com as fotografias.
A situação é tão complicada que se os policiais admitirem que
são eles quem fornecem as informações e fotografias, eles incorrem em desvio de
função com o risco de sofrerem severas punições, e se a assessoria de
comunicação do 29º BPMERJ assumir a autoria do envio das informações e
fotografias, o estado incorre no risco de sofrer ações de reparação de danos em
cascata, sem contar que muitas ocorrências ficam comprometidas com esta
ilegalidade, podendo até anular o processo.
O noticiário policial em nossa região tem se tornado em um
verdadeiro tribunal midiático de exceção, onde os veículos somente noticiam o
momento da ocorrência ou da prisão, sendo que ali o processo somente se inicia,
e o fato da notícia não acompanhar a continuidade dos desdobramentos
processuais da ocorrência, ela perde completamente a credibilidade por apenas
deixar a impressão inicial levando a opinião pública a condenar, injustamente
em muitas vezes, os indivíduos detidos.
Essas notícias jamais informam alguma
coisa, apenas condenam quem ainda sequer pôde se defender
Como exemplo vamos recordar que em janeiro deste ano
tivemos noticiada em diversos veículos que se fartam com o sensacionalismo
policial a grande “operação abre alas”, que teria sido realizada em conjunto
entre Polícia Civil e Polícia Militar com a detenção de cinco indivíduos, e sua
repercussão ganhou toda região.
No entanto nenhum dos veículos que noticiaram o fato na época acompanharam o mesmo até seu status atual em que todos os cinco detidos foram
liberados, lembrando a todos que as prisões foram de caráter temporário, para
tão somente proceder nas investigações sem que os suspeitos interfiram na
mesma, e como os mesmos não comprometem nos trabalhos do inquérito em andamento
nesta fase, todos se encontram soltos e exercendo seus direitos de ampla
defesa. Especula-se que dos cinco detidos, quatro serão inocentados por não haver subsídio algum que os incriminem.
Uma notícia recente que também não procede em seu conteúdo dá
conta da prisão de um “foragido da justiça” no complexo Esportivo do Pimentel
Marques, o indivíduo em tela não era foragido, ele havia sido condenado a
prestação de serviços comunitários e não tinha plena interpretação de sua pena,
com isso sem saber da condenação ele não cumpriu com a pena de prestação de
serviços comunitários, e a justiça determinou sua prisão para que o crime não
prescrevesse.
É indiscutível que o foragido da justiça tem conhecimento de
sua ordem de prisão judicial, por isso ele foge ou se esconde para não ser
preso, e não uma pessoa que desconhece estar com mandado de prisão decretado, ficando completamente
exposto em uma área pública de grande frequência.
O que se espera da mídia sensacionalista é somente uma
reflexão das consequências que este tipo de noticiário está veiculando
diariamente em nossas redes sociais, o processo de marginalização e
criminalização dos cidadãos pobres e periféricos somente contribui para o
aumento da criminalidade e da violência, mais uma vez ressalto, nosso sistema penal prevê
somente a recuperação e ressocialização do indivíduo para conviver novamente em
sociedade, e este tipo de linchamento moral praticado pela mídia
sensacionalista que se transforma em uma industria do ódio e da intolerância não contribui em absolutamente nada para este objetivo.
A criminalidade somente aumenta com este festival de
violações contra quem comete crimes, ou até mesmo contra aqueles quando são envolvidos injustamente, sobretudo se observarmos que mais de 60% dos apenados voltam a cometer crimes depois de soltos.
Reflitam senhores da mídia!
Comentários
Postar um comentário
Comente sobre este assunto aqui!